Dickson é anarquista, fã de Raul Seixas e professor de geografia da rede pública. Gente boa da melhor qualidade. Sempre o encontro entre cascos e mais cascos de Brahma no bar de Nazaré, invariavelmente nos três turnos.
Ontem, o ponteiro do relógio já perto das 22h, cheguei ao boteco para dar aquela lavada no fígado antes de descer para o samba no bar do Pedrinho. Dickson estava lá, pelo andar da carruagem desde o início da tarde. Sentado à mesa devidamente instalada entre os paralelepípedos da rua coronel Cascudo, se derramava numa canção antiga para o desespero dos amigos que o acompanhava naquele começo de noite. Um número que faria corar de vergonha o finado Helmut, melhor intérprete de Nelson Gonçalves da história do Beco da Lama.
Não quis incomodá-lo e sentei-me à mesa dois, próximo ao balcão, dentro do estabelecimento. Finda a cantoria, hora de pagar a conta. Dickson se dirige ao recinto contando as moedas dos três cascos que lhe coube na dolorosa. Dinheiro curto, senti que a coisa tinha apertado. O professor vira para o lado, mira os olhos da dona do botequim e manda na lata:
- Tem uma moeda aí, Nazaré?
Silêncio no bar.
Refeita do susto em três longos segundos, a mãe do Paulinho não acreditou na ousadia do cliente e amigo:
- Mas esse Dickson é muito cara de pau mesmo!
Com medo que a reação descambasse para a agressão física, o grand finale saiu melhor que a encomenda:
- Calma Nazaré, eu estava só interprentando...