sexta-feira, 3 de abril de 2009

BECO VIVO DA LAMA

As regras da eleição para a atual diretoria da Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências (SAMBA) foram definidas na assembleia geral realizada na noite de ontem, 3 de abril, no auditório do Solar Bela Vista, no Centro. Ficou acertado que a eleição vai rolar dia 1º de maio, no Dia do Trabalho. Vota quem tem o nome no famoso livro preto, reapresentado durante a Assembleia. Isso dá por volta de 300 eleitores. As incrições de chapa acontecem até o dia 29 de abril (dois dias antes da votação).

No entanto, já existem duas chapas em campo: uma encabeçada pelo publicitário Lula Augusto, que traz o editor e sebista Abimael Silva na vice-presidência, e outra com o ex-presidente da Samba, o jornalista, poeta e artista plástico, Eduardo Alexandre, o Dunga. O vice da chapa ainda não sei quem é. O mandato é de 3 anos. Então é isso. Mais pra frente eu escrevo com mais calma e trazendo detalhes dessa eleição que promete muito bate-boca, para dizer o mínimo.

Por enquanto, deixo vocês com a reportagem que fiz no dia da votação da eleição anterior, realizada em 2006, quando o professor de xadrez e matemática, Ubiratan Lemos, venceu o jornalista Alexandro Gurgel. A diferença foi de 72%. Confesso que foi bem divertido fazer a matéria. Espero que vocês se divirtam também.


BECO VIVO DA LAMA

Rafael Duarte - Repórter



Caldo de mocotó, “churrasquinho de gato” e cerveja gelada. Tudo isso no meio da rua com a população desavisada, mas de olho na urna instalada no coração do Beco. Na medida certa para consagrar o novo presidente da Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências (Samba) - entidade organizada há 14 anos para levantar a imagem de um dos pontos mais tradicionais da cultura boêmia de Natal - na primeira eleição direta da história da comunidade.

O pleito ocorreu sábado passado em frente ao bar Quatro Cantos (antigo bar do Nasi) e “lavou” o Beco. Agora, a responsabilidade pela gestão da Samba, durante os próximos três anos, está nas mãos do professor de xadrez e matemática Ubiratan Lemos, de 43 anos. Ele encabeçou a chapa Beco Vivo e conquistou 72 dos 100 votos válidos. A concorrente liderada pelo jornalista Alex Gurgel, Sempre Samba, teve o apoio de apenas 26 pessoas. Dois sócios anularam o voto.

Ao todo, 322 eleitores estavam aptos a escolher o sucessor do poeta e jornalista Eduardo Alexandre (Dunga), segundo presidente da história da Samba e reconhecido pelo trabalho que fez à frente da entidade. A posse da nova gestão deve ocorrer no dia 17 de maio, durante o II Carnabeco.

PROFESSOR BIRA DIZ QUE GRANDE PROJETO PARA O BECO É SOCIAL

Poeta, comunista, libertário, casado, pai de uma menina e freqüentador do Beco há 18 anos, o “Professor Bira” acredita que a vitória veio pelo empenho dos 38 componentes de chapa. Ele prometeu equilibrar as ações culturais e sociais da região ao lembrar que o carro chefe da campanha, o projeto “Dê uma hora ao Beco”, pretende ocupar a juventude que freqüenta o Beco da Lama e as adjacências, como a praça André de Albuquerque. “Vamos manter e ampliar os projetos culturais desenvolvidos pela gestão passada porque ninguém é doido de fazer o contrário se deu certo. Mas o grande projeto da gente é social. Aqui tem muito jovem abandonado, menino de rua mesmo, sem ter para onde ir.

Acho que temos o dever de mudar isso. E não vai custar nada. Vamos pedir que quando os freqüentadores vierem tomar sua cerveja, que cheguem uma hora mais cedo para orientar, ensinar e passar alguma mensagem para a juventude que cresce aqui. No Beco a gente tem artista, jornalista, advogado, professor... A idéia é fazer uma programação e até remunerar esse pessoal”, explicou.

O plano prevê parcerias com empresas privadas através das leis de incentivo à cultura. “Nosso primeiro contato será com a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) para mostrar as idéias e tentar acertar um apoio. A gente tem que ocupar essa garotada. Todo mundo tem que participar”, disse.

Bira conta que seu nome surgiu entre os “amigos de copo” quando a chapa concorrente já havia sido definida. No entanto, o nome de Alex Gurgel não foi digerido pelo grupo, segundo ele, pela ausência do jornalista nos principais eventos realizados no Beco. Na verdade, o Beco da Lama ganhou tanta visibilidade nos últimos anos por conta dos eventos organizados pela Samba com o apoio do Estado, que a eleição teve uma importância ainda maior para a comunidade que freqüenta o local. Prova disso é que em vez de um grupo apontar um nome para administrar a Samba, como ocorria até então, pela primeira vez na história do Beco o pleito foi decidido através de votação direta.

De fato, por atrás do discurso fraterno do vencedor, havia uma declarada disputa de terreno. “Todo mundo das duas chapas se conhece, toma cerveja junto. Mas o Alex é muito recente aqui. Quando ele anunciou a candidatura, vieram me perguntar se a gente ia deixar ele tomar o Beco da gente. No I Carnabeco ele não apareceu, no I Pratodomundo também não veio. Acho que não chegou a vez dele”, disse.

Procurado pela reportagem ainda durante a votação, Gurgel desmentiu o concorrente e criticou algumas propostas da Beco Vivo, como o “Tributo à Che Guevara” que, com a vitória de Bira, deve ocorrer durante esta gestão.

O jornalista centrou suas propostas na área cultural e defendia a construção de uma sede para a entidade. “Essa história de que eu não estava aqui nos eventos é conversa fiada dele. O problema é que eu dou aula no sábado e não posso chegar aqui mais cedo. Agora, eles têm umas propostas que não entendi. Homenagear Che Guevara!? A gente tem tanta gente importante do nosso Estado que poderia ser valorizada, como Newton Navarro, Câmara Cascudo, Auta de Souza... e eles querem fazer um tributo à Guevara!? O Beco tem que valorizar a cultura da terra”.

Mesmo diante das provocações veladas e tão comuns em eleições, a votação ocorreu num clima de harmonia até às 17h, quando a comissão eleitoral divulgou o resultado. Daí para frente não mudou muita coisa. Mais caldo de mocotó, “churrasquinho de gato” e muita cerveja gelada.

A FAUNA DO BECO SÓ CRESCE

Marcos Boi, Ajax Felipe, Zé da Pindoba e Anaxágoras de Lima. Artemilson, Robério “O Coisa” e Biba Thompson. Paulo Zero Grau e Adebal Galego Feio. Assim de supetão, a relação parece a escalação de um time de pelada. Mas estavam todos lá marcando presença. Titulares absolutos da lista de sócios da Samba. Afinados para a escolha do presidente mais popular do Beco.

Ainda que consagrado pelo tempero libertário, o universo do Beco da Lama é democrático. Principalmente quando o assunto é o convívio humano. A rotina da região é feita sem distinção. Da anarquia à direita. Da esquerda ao que sobrou do paraíso. É onde o guardador de carros e o deputado passam para tomar a saideira antes de voltar para casa.

Ponto de encontro de artistas, jornalistas, advogados, professores e autoridades, o Beco, hoje, tem mesa reservada até na Câmara Municipal de Natal, onde cinco vereadores montaram o que a boemia local chama de “bancada do beco”. A idéia é trazer à tona carências como questões de infra-estrutura ligadas ao espaço.

O presidente da Comissão Eleitoral que organizou o pleito de sábado, Plínio Sanderson, contou que o grupo de parlamentares incluiu no orçamento geral deste ano uma verba de R$ 300 mil para a urbanização do Beco. “O Beco hoje está precisando de ajuda. Está sujo, largado nesse aspecto”.

CERVEJA E NOME NA LISTA

Em dia de eleição, regra é regra até no Beco da Lama. É verdade que a boca de urna estava institucionalizada pelo megafone na mesa da comissão eleitoral - usado pelo sócios que quisessem declarar o voto. Mas só votou quem tinha o nome na lista. Ainda assim, alguns “companheiros de copo” desavisados insistiam em participar.

O caso mais curioso foi o de uma senhora meio “alta” com pinta de alemã que se identificou, atropelando as palavras e depois de muita discussão, como artista plástica Josineide Varela, de 63 anos. Ela queria votar de qualquer jeito, mesmo admitindo que não conhecia os candidatos nem as chapas concorrentes.

A cena não chegou a ser um “barraco” (não passou de um bate-boca com o candidato pela chapa Sempre Samba, Alex Gurgel) mas valeu pelo inusitado e para mostrar porque o Beco da Lama é considerado ainda o ponto mais rico da boemia natalense. Eis os “melhores momentos” do diálogo entre Josineide e Alex Gurgel:

Josineide: Eu gosto de chutar (faz o movimento rápido como se levasse o copo à boca) por aqui. Mas onde é que a gente vota?.

Alex: O nome da senhora está na lista?

J: Que lista, meu amigo! Venho aqui todos os dias. Só quero votar... A: Mas a senhora só pode votar se tiver o nome na lista. Se não tem, não vota.

J: Como é que é? Você vai me dizer agora como eu devo fazer, é? Minha mãe morou por aqui a vida toda! Todo mundo me conhece aqui. Vou votar sim.

A: Minha senhora, entenda: é uma regra. Imagine se todo mundo que quisesse votar viesse para cá? Não ia ter condições. Se o prefeito de Natal quisesse votar hoje ele não podia porque o nome dele não está na lista. Me diga porque a senhora votaria?

J: O que é isso, meu amigo!? O prefeito é uma autoridade! Você não pode fazer isso. Vou votar e ainda trouxe dois amigos que vieram da Alemanha para votar também.

A: Minha senhora, não pode! A senhora conhece pelo menos os candidatos que estão participando da eleição?

J: E eu lá quero saber de candidato, meu amigo! Vou votar no melhor. Me diga uma coisa: vocês tem sede?

A: Não.

J: Meu amigo, vocês não têm nem sede e ainda querem me impedir de votar? Como é que pode?

A: Mas se a senhora não sabe nem quem são os candidatos... J: E você lá conhece algum candidato!

A: EU SOU CANDIDATO! Ta vendo? Como é que a senhora quer participar se não sabe de nada?

J: Olha aqui, quero uma cerveja. Não dá para conversar com você sem tomar cerveja.

A: Tem vários bares aqui...(ele aponta para a região) J: (depois de entrar e sair do bar em frente onde a discussão se dava, ela volta provocando) Aqui não tem cerveja. Quero votar.

A: Eu já lhe disse que a senhora não vai votar.

J: Que absurdo! Você sabe porque isso está acontecendo?

A: Porque a senhora não tem o nome na lista...

J: Não! Porque não tem organização! Isso é coisa de brasileiro! O Congresso Nacional só tem safado. Isso o que está acontecendo aqui é uma sacanagem...

A: A senhora está misturando as coisas. Não tem nada a ver uma coisa com outra. Aqui é a eleição da Samba.

J: De quem? Está vendo? Até o nome é uma porcaria (diz o nome Samba com desdém e dança na frente do repórter e do candidato numa cena que lembrava as chanchadas da década de 70).

A: Mas Samba é Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências. Olhe, a senhora não sabe nem o que significa o nome da entidade. Quanto mais votar...

J: Olhe aqui, meu amigo: eu vou me candidatar à vereadora nas próximas eleições e ainda vou ter mais votos que você! Agora eu vou tomar uma cerveja e depois vou votar, você não vai me impedir! (depois de se despedir, ao seu estilo, Josineide vai até à urna e fala alguma coisa para o mesário, que balança a cabeça negativamente. Em seguida, ela resmunga, olha para o lado e entra no bar mais próximo atrás da famigerada cerveja).

terça-feira, 31 de março de 2009

MEIAS VIVARINA E FACAS GUINSU: O DUELO MORAL DO JORNALISMO POTIGUAR

Antigamente, bote aí na conta dos anos 80, início dos 90, passava na TV um programa chatíssimo na madrugada. Era uma espécie de feira eletrônica, que vendia tudo quanto era tipo de bagulho. Tinha de relógio à prova de tiro a uma cera para carro que não deixava a lataria pegar fogo, como se um carro pegando fogo fosse a coisa mais natural do mundo. Mas vá lá. Hoje, talvez ainda passe algo parecido na TV fechada, mas iguais aqueles ainda não vi.

Quem está quase na casa dos 30, como eu, não esquece, por exemplo, do antológico duelo entre as meias Vivarina e as facas Guinsu. Primeiro, vinha uma gostosa dizendo mais ou menos que as meias Vivarina estavam para a indústria de confecções como o Mun-há estava para o mundo. As meias, na visão do comercial, tinham vida eterna. Nos cálculos da mulher, podia passar o que fosse por cima da pobre da meia que não desfiava nem com a gota serena. Aí, depois daquela explicação de laboratório, vinha um japonês tentar engabelar o idiota do espectador com a danada das facas Guinsu. Segundo o japa, não existia nada no mundo que a porra da faca não cortasse. O cara, sentado no sofá, à espera do sono que não vinha nunca, se pegava imaginando as coisas mais escrotas do mundo. Eu mesmo, numa daquelas noites terríveis, pensei na bixa da ponta afiada serrando um trator. É claro que a viagem durou pouco, apenas alguns segundos. Nesse dia, lembro bem, a vergonha desceu feito cerveja quente e achei melhor desligar a TV antes que minha situação piorasse.

Mas estava feito o duelo. E não era qualquer duelo, diga-se de passagem. Já tratava-se de um duelo moral. Quem ganhava de quem aquela parada? As meias Vivarina conseguiriam segurar a onda das poderosíssimas facas Guinsu, ou as facas não eram de nada? Confesso que nunca comprei nem uma nem outra. E também não sei de ninguém que tenha conseguido desvendar o mistério que atormentava o meu sono na madrugada.

Na verdade, me lembrei desse duelo depois de saber pelos blogs e jornais da cidade da briga ridícula entre a chefe de redação do Jornal de Hoje, Thaísa Galvão, e do editor de política do JH 1ª Edição, Alex Viana. Não sei nem como começou a arenga. Mas pense numa disputa. Thaísa Galvão, que nas horas vagas assessora o secretário estadual de Planejamento, Vágner Araújo, isso desde que ele e Wilma tomaram posse (e lá se vão sete anos), foi dizer que Alex Viana tinha como padrinho político na assessoria da Codern o deputado federal Rogério Marinho. Para quem não sabe o que isso significa é a mesma coisa que dizer que foi RM quem colocou o boy para trabalhar na Codern. Como os nomes têm mudado muito ultimamente, entenda isso como “Alex Viana é da cota de Rogério Marinho”. Pois bem. Então eu abro o JH na manhã de segunda-feira e lá está a resposta do rapaz numa nota cujo nome já é uma pérola: “Nada a esconder”. Abaixo, um dos trechos mais hilários já produzidos pela nossa crônica política:

“...Quanto à assessoria de imprensa da Codern, estou lá pelo mesmo processo pelo qual você está na assessoria de imprensa da secretaria estadual de planejamento. Talvez com uma diferença moral significativa. Eu dou expediente, de segunda a sexta, das 7h30 às 11h30 e das 13h30 às 17h30, assinando ponto, religiosamente, todos os dias, como qualquer profissional, sendo indicado, ou não, faria”.

E ainda arremata:

“Já quanto a você, qual foi a última vez que pôs os pés na Seplan? Em 2003, quando a governadora Wilma de Faria foi eleita e Vágner Araújo assumiu a secretaria?”

Se eu bem entendi, um se iguala ao outro na forma como a boquinha apareceu para os dois. A diferença, MORAL, é a frequencia cumprida religiosamente. O incrível é que ainda sobra tempo para fechar o jornal e, sabe-se lá, dividir a quentinha com o vigia da empresa.

Foi então que me veio os antigos comerciais da Vivarina e da Guinsu nas idéias. O duelo está de volta. É, mais uma vez, a moral que está em jogo. Eu, do meu canto, já adianto e confesso que não vou comprar essa briga. Um amigo, a quem relatei a história do trator na época, é quem estava certo. Esse duelo entre as Vivarina e as Guinsu é igual a enterro de anão: se existe, ninguém nunca viu.