quarta-feira, 23 de junho de 2010

A SAIDEIRA DE LOURIVAL




Lourival cantou para subir. Pediu a saideira na madrugada de hoje por conta de problemas cardíacos. Deixa uma legião de admiradores. Há uns dois meses fiz uma reportagem para o NOVO JORNAL sobre a relação dos donos de butecos com os bares. Fui até lá, mas o comandante estava dormindo e, a entrevista, foi feita com o Júnior, o filho que já dava conta do recado há um bom tempo. Sempre que parava no buteco, perguntava por 'seo Lourival'. Júnior dizia num tom triste que o pai estava bem, mas já bastante cansado. Sempre me recebia com um sorriso no rosto. Era atencioso com todos os clientes.

Embora não seja um freguês assíduo do buteco, guardo uma história inesquecível do estabelecimento batizado de 'Universidade da Deodoro'. Depois de tentar, por oito vezes, uma vaga de repórter estagiário no Diário de Natal, consegui a chance dia 5 de agosto de 2005, dois dias após o meu aniversário. No dia, cheguei a redação mais cedo que o chefe de reportagem, por volta das 7h, mas já depois do velho Machado, o funcionário mais antigo da redação e espécie de 'faz tudo' que se notabilizava por ser o primeiro a chegar e último a sair do jornal. Levei uma fuzilada com o olhar do decano depois de um simples bom dia e aguardei a chefia para a primeira pauta da carreira.

Duas horas mais tarde, fui incumbido de suitar (no jargão jornalístico é o mesmo que repercutir) o aniversário de 1 ano de um buraco de uma rua adjacente à praça do Relógio, no bairro do Alecrim. Por falta de carro, tive que fazer por telefone. Liguei para um ou dois comerciantes. Matéria pronta, dever cumprido. Já passava do meio-dia, fim do expediente. Àquela altura do campeonato, o desejo de comemorar o primeiro dia de trabalho como repórter falava mais alto que qualquer coisa. Liberado pelo chefe, desci a escada da redação, passei pela portaria do jornal e olhei para a esquerda.

O bar do Lourival parecia uma miragem. Tomei o rumo do buteco e sentei na primeira mesa, grudada na parede que faz fronteira hoje com a rádio 96 FM. Num passo curto, um senhor com um sorriso inocente no rosto perguntou o que eu desejava. Pedi uma cerveja bem gelada, me trouxe uma Brahama. Um primeiro gole vitorioso, inesquecível. De volta com a segunda Brahma e mesmo com clientes para atender, puxou conversa. Cheio de orgulho, falei que trabalhava no Diário de Natal. Como se voltasse no tempo, Lourival me contou que o bar já tinha sido muito frequentado pelos jornalistas do jornal, como Sanderson Negreiros, Worden Madruga, Vicente Serejo, Pepe... no fim me deu boas vindas antes de seguir o rumo das outras mesas. A terceira Brahma quem me trouxe foi o Nicó, garçom tão tradicional como o estabelecimento. Paguei a conta feliz da vida e convicto de que, no primeiro dia de repórter, o bar do Lorival era parte da minha história.