O cruzamento da avenida Jaguarari com a rua Segundo Wanderley, no Barro Vermelho, tem mais de 25 anos de história. É ali, sob o toldo que desce sempre que o sol devora o asfalto, que Mário comanda o buteco que herdou do sogro. Um lugar que, segundo ele, vendia de tudo. Tanto vendia que decidiu manter a essência ao batizar a casa de Bar e Mercearia do Mário. Uma grande homenagem, registre-se. E lá se vai um quarto de século desde que assumiu os trabalhos.
O ritmo, para quem já passou da casa dos 60, faz inveja a qualquer empresariozinho metido a entendedor do assunto. O buteco do Mário, simplesmente, não fecha. De segunda a segunda, no passo arrastado do dono do estabelecimento. No domingo, o portão de ferro da casa desce mais cedo, às 17h. Mas no restante da semana Mário vai ao sabor da freguesia.
Conheci o Mário num dia desses de semana. A idéia era preparar o terreno para o almoço. Mas o ambiente e a hospitalidade do anfitrião mereciam algumas boas horas de conversa. Pequeno, mas não apertado, o buteco é acolhedor. A fotografia de corpo inteiro do craque Marinho Chagas em dia de Botafogo e o escudo do Santos na prateleira denunciam a intimidade que Mário tem com o passado. Foi boêmio dos tempos da Ribeira, confessa. As imagens dos fregueses mais fiéis por todos os lados e em todas as paredes deixam claro aos marinheiros de primeira viagem que o buteco é de família.
O clima é provinciano. A certa altura do meio-dia, um amigo da casa salta do carro mal-estacionado rente a calçada do bar. Entra rápido, cumprimenta duas figuras que bebem próximo ao balcão, pede uma dose de cachaça, vira num gole só, paga e vai embora. A visita não durou dois minutos. O bastante, no entanto, para perceber a intimidade da freguesia.
Numa mesa próxima à nossa, Eliezer, um militar reformado da Marinha, vai puxando um assunto atrás do outro como se já bebêssemos na casa desde sua fundação. De futebol à pena de morte, a conversa de botequim só respeitava a hora sagrada do banheiro. Nisso, já tinham passado por ali um pintor de parede que parou para tomar UMA e outros dois sujeitos que também chegavam da lida e, ao contrário da gente, conseguiram fazer do buteco do Mário um ponto de passagem após algumas doses de cachaça.
A tarde já havia pedido licença quando entra no estabelecimento um senhor já a caminho dos 80 anos. Passos curtos, Souza se enturmou logo na conversa. E não demorou muito para apresentar seu lado poeta. Recitou três poemas assinados por ele e foi embora depois de duas cervejas.
Sozinho atrás do balcão, Mário observa tudo. Cena por cena. De lá, fala de futebol, boemia, vaticina que o grande defeito do amigo Eliezer é gostar muito de mulher e conta a história de como veio parar ali, a relação com o sogro e tal. Na hora da despedida, dez cervejas, seis pasteizinhos e um queijo de coalho depois de quando tudo começou e quando imaginávamos que só as estórias já tinham feito a tarde valer a pena, Mário surge com uma barra de chocolate Suflair, daquelas grandes, e antes de qualquer reação olha para Ana Paula, minha parceira de todas as horas, e diz absoluto:
- Esse aqui não é um presente meu, mas da INSTITUIÇÃO bar e mercearia do Mário. Espero que vocês voltem logo.
Eis a grande definição do buteco dita, assim, como manda o figurino, pelo dono do estabelecimento. O bar do Mário é uma INSTITUIÇÃO, como devem ser e são os botequins de verdade.
E é óbvio que voltaremos.
6 comentários:
Rafael, quando voltar lá por favor me chame!!! Esse bar eu só conheço de nome, ainda!!! rsrsrsrs
Abraço!
Claro, Armando. Vou te apresentar a figuraça que é o seu Mário. Gente fina e exímio conhecedor da boemia dessas plagas. Abraço.
eu imagino sua dificuldade em fazer essas matérias rsss
Seja bem chegada ao nosso balcão, Yasmine. Pode ter certeza que é bem difícil, viu? Difícil ir embora, na verdade. E lembrar de tudo depois. Bjo
Pena que da próxima vez não vai mais ter chocolate...
A despeito do desconhecimento de Armando, eu conheço o Bar de nome e cachaça. E grande!.rs. Mas o Mário (quem?.rs) é uma figura engraçada: ele sério, em foto 3x4, parece sisudo. Mas é figura de muito bom humor. Vale uma ida demorada com time completo!..rs
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