terça-feira, 7 de julho de 2009

DIRETO DA REDAÇÃO

Começo hoje, aqui neste espaço, a primeira série do Meio da Rua. Todas as terças-feiras, publicarei algumas pérolas testemunhadas por mim ou que tiveram esse jornalista que vos escreve como protagonista. Geralmente são histórias engraçadas que a gente costuma relembrar na conversa com os amigos, claro, em mesa de bar. Um detalhe importante: como não fui autorizado por ninguém a publicar mico dos outros, devo omitir os nomes dos verdadeiros autores de algumas acontecências das redações do Diário de Natal e da Tribuna do Norte, os dois jornais da cidade em que trabalhei. Hoje, de volta ao DN depois de três anos, sigo anotando as proezas que vejo. Tudo assim, Direto da Redação.

O DIA EM QUE A ENTREVISTA COM DOM HELDER CÂMARA CAIU NO BURACO

Conhecido pela atuação humanitária em favor dos pobres e, principalmente, dos perseguidos políticos na época da ditadura militar, o arcebispo de Olinda Dom Helder Câmara morreu em 1999. Quando iniciei no jornalismo, dia 5 de agosto de 2005, conhecia pouco da biografia do santo padre pernambucano, mas o suficiente para saber que ele não estava mais entre nós. O problema é que, numa redação de jornal, não existe verdade absoluta. Ainda mais quando se está começando. E principalmente quando é o seu primeiro dia como estagiário num jornal da chamada grande imprensa potiguar, como o Diário de Natal.
Logo, qual não foi minha surpresa quando o chefe de reportagem do DN, Marcos Ramos, hoje editor do caderno Interior, do Jornal de Hoje, iniciou o seguinte diálogo:

- Você é católico?, perguntou-me o chefe.
- Sou, mas não pratico.
- Ah, pelo menos você não é crente. Acho que você é o repórter ideal. - Para quê?, retruquei já imaginando que faria a matéria do ano no primeiro dia de trabalho.
- Amanhã você vai entrevistar Dom Helder Câmara.

Aquilo, para mim, caiu como uma bomba. Mas fui em frente sem entender.

- Como?, eu questionei num misto de certeza e espanto.
- Dom Helder Câmara, o arcebispo, não conhece?
- Conheço.

- Então depois procure a biografia dele na internet para você saber quem é. Temos que checar que hora ele chega.

A essa altura eu já duvidava de tudo o que eu tinha aprendido na faculdade de jornalismo e, principalmente, já dava o velho quase como ressuscitado.

Tive uma idéia. Respirei fundo e imaginei, óbvio, que se tratava de alguma pegadinha do chefe com o estagiário, daquelas que a gente conhece só das histórias contadas por jornalistas mais velhos. Estava na cara: o chefe de reportagem queria me sacanear. Enquanto eu estivesse lendo a biografia resumida de Dom Helder Câmara na internet ele estaria mijado de tanto rir do trote em cima do otário aqui.

(Aqui, uma pausa. Quando entrei no jornal, a redação do Diário era escura, os móveis antigos e os computadores, provavelmente, eram os primeiros da era pós-maquina de escrever).

Pois bem. Vendo Marcos Ramos de um lado para o outro da redação, resolvi abordá-lo novamente. Fingi que esqueci o nome do entrevistado e retomei diálogo:

- Marcos, qual é o nome do arcebispo que eu vou entrevistar, mesmo?
- Dom Helder Câmara., ele repetiu para o meu desespero.

Continuei suando frio:

- Você tem certeza que é Dom Helder Câmara?

A essa altura do campeonato eu já estava com medo de dizer que o velho tinha morrido e ouvir que eu não sabia de nada e, por isso, não serviria para trabalhar em redação. Até que, sabe-se lá como e por onde, entrou um pouco de luz na redação do DN e a polêmica acabou quando Marcos Ramos pegou a pauta da minha mão.

- Peraí. Helder Câmara não! Você vai entrevistar o Dom Eugênio Sales, arcebisto de Natal, que está vindo do Rio de Janeiro. Dom Helder Câmara já morreu, cara!

Ele disse tudo isso rindo como se eu não soubesse do acontecido. Me deu dois tapinhas nos ombros antes de dizer que meu expediente já havia terminado.

Respirei aliviado e fui para casa vasculhar a vida de Dom Eugênio Sales na internet. Voltei no dia seguinte afiado e empolgado com a entrevista. Minha alegria acabou quando recebi a pauta: a entrevista foi repassada para outro repórter. Para mim, sobrou uma grande notícia: continuar, por telefone, a matéria de uma colega que participou, no dia anterior, das comemorações pelo aniversário de 1 ano de um buraco aberto próximo a praça do Relógio, no Alecrim.

Para quem ia entrevistar um defunto, cair num buraco foi um grande começo.

3 comentários:

Sérgio Vilar disse...

Já tinha esquecido como era bom andar no meio da rua!

Ana Paula Costa disse...

Ainda bem q não ressucitaram os mortos e vc já começou prevendo que sua sina era ser repórter de meio ambiente e urbanismo...hehehe
Bjs

Armando Miranda disse...

Salve, salve!!! Espero que agora seja pra valer.
Abraço!